Artigo Escrito pelo Eng. Túlio Mendes
Introdução
Com a evolução de novos equipamentos nas áreas de topografia e geodesia é interessante o estudo e analise dos resultados obtidos por diferentes metodologias. Os equipamentos de determinação das coordenadas geográficas mais atuais proporcionam uma maior exatidão nas mensurações, facilitam a manipulação e diminui o tempo em campo, este último é um dos fatores mais interessantes para os usuários, devido a redução do custo da mão de obra in loco.
A obtenção de coordenadas geográficas tem por finalidade a determinação do perímetro da área, a dimensão, a posição da área no globo terrestre e outros produtos indispensáveis no dia a dia do profissional. Para realizar a determinação das dimensões e contornos de uma determinada área existem vários aparelhos dos quais dois serão citados: a Estação Total e o receptor GNSS, os quais tem uma considerável, diferença nos princípios de funcionamento. Sendo que o primeiro equipamento necessita que os pontos de interesse sejam intervisiteis entre si, já o segundo equipamento não necessita de visualização entre os pontos, pois se orientam por sinais de satélites e ondas de rádio.
Para qualquer tipo de levantamento seja ele com a Estação Total ou receptores GNSS são passiveis de erros em suas medidas. Abaixo serão detalhados os principais tipos de erros intrínsecos aos equipamentos.
Características e erros da Estação Total
Neste item serão apresentados os erros inerentes à Estação Total. Em um levantamento topográfico podem haver três erros básicos relacionados às condições climáticas, equipamentos e do operador. Por mais confiantes que sejam os aparelhos e por mais cuidado que o operador tome ao proceder a um levantamento topográfico, as medidas obtidas jamais estarão isentas de erros, (VEIGA; ZANETTI; FAGGION, 2007). As fontes de erros poderão ser:
- Condições ambientais: são causados por alterações nas condições ambientais, como o vento e temperatura. Um exemplo clássico é a alteração do comprimento da trena com a variação da temperatura.
- Instrumentais: causados por problemas de ajuste do equipamento. Uma grande parte dos erros oriundos dos aparelhos pode ser reduzida adotando técnicas de verificação/retificação, calibração e classificação, além de técnicas particulares de observação.
- Pessoais: originados por falhas do operador, como falta de atenção ao executar uma medição e cansaço.
Todos os três erros citados anteriormente são mais conhecidos como: Erros grosseiros, sistemáticos e aleatórios que serão detalhados a seguir.
Erros Grosseiros: Originados por engano na medida, leitura errada nos instrumentos e ou identificação de alvo, geralmente relacionados com a falta de atenção do observador ou falha no equipamento. E de responsabilidade do operador ter cuidados para impedir a sua ocorrência ou detectar a sua presença. A forma mais eficaz de verificar as falhas é realizar a repetição de leituras.
Erros Sistemáticos: São erros cuja intensidade e sinais algébricos podem ser determinados, adotando leis matemáticas ou físicas. Por serem erros com causas conhecidas eles podem ser evitados a partir de técnicas de observação ou até mesmo eliminados com a aplicação de fórmulas específicas. Esses tipos de erros são acumulativos ao longo do trabalho.
Erros Aleatórios: São aqueles que permanecem mesmo após a eliminação dos erros grosseiros e sistemáticos. São erros que não seguem nenhum tipo de lei e ora ocorrem num sentido ora noutro, tendendo a se neutralizar quando o número de observações é grande.
É importante lembrar que alguns erros se anulam durante a medição ou durante o processo de cálculo. Deste modo, um levantamento que visivelmente não apresenta erros, não significa estar necessariamente correto.
Características e erros das observáveis GNSS
Segundo Caldas (2014) todas as medidas realizadas a partir do GNSS, sejam a (pseudodistância ou fase da portadora) são vulneráveis a erros que prejudicam a precisão das posições levantadas.
De acordo com Monico (2008), o sistema global de navegação por satélite é composto por duas observáveis e que as mesmas permitem determinar a posição de um objeto, a velocidade e o tempo, são elas:
- Pseudodistância a partir do código; e a
- Diferença de fase da onda portadora.
Para realizar a medida da observável pseudodistância é necessário correlacionar o código gerado pelo satélite no momento da transmissão (tt) com sua réplica gerada no receptor no instante de recepção (tr). De acordo com Monico (2008) a equação da pseudodistância entre o satélite (s) e o receptor (r) pode ser descrita como:
(1)
Onde:
- : distância geométrica entre o satélite, no instante de transmissão do sinal, e o receptor, no instante de recepção do sinal;
- c: velocidade da luz no vácuo, em m/s;
- : erro do relógio do receptor em relação ao tempo GPS, em segundos;
- : erro do relógio do satélite em relação ao tempo GPS, em segundos;
- : erro causado pela ionosfera, em metros;
- : erro causado pela troposfera, em metros;
- : erro causado pelo multicaminho, em metros;
- : erro da medida de pseudodistância devido aos efeitos não modelados e aleatórios, em metros.
A medida da fase da onda portadora () (mais precisa que a pseudodistância) é realizada através da diferença entre a fase do sinal gerada no satélite, no momento que o mesmo transmite o sinal, e a fase gerada no receptor no momento da recepção do sinal. Somente uma medida fracionaria é obtida, restando os ciclos completos (inteiros), conhecido como ambiguidade (N). Monico (2008) descreve a equação da fase de abatimento da onda portadora como sendo:
(2)
Onde:
- : frequência da fase;
- fase gerada no satélite, na época de referência ;
- fase recebida no receptor, na época de referência ;
- ambiguidade da fase;
- erro da fase da onda portadora.
O receptor mede a parte fracionaria da fase da onda portadora e contam o número de ciclos inteiros coletados no receptor, resultando em uma medida continua. A ambiguidade representada por () determina o numero de ciclos inteiros entre o satélite (s) e o receptor (r) no momento em que o receptor é ligado (MONICO, 2008).
A acurácia que pode ser obtida nas observáveis GNSS em relação à pseudodistância pode se aproximar em unidades métricas ou até mesmo em alguns decímetros, já na fase da onda portadora a acurácia obtida poderá ser de poucos centímetros ou até mesmo em unidades milimétricas, (MONICO, 2008).
Cabe ressaltar que, além das observáveis destacadas acima outras podem ser obtidas com o GNSS (variação Doppler, Razão Sinal Ruído (SNR) e outros). Como todas as observáveis envolvidas no processo de mensuração estão sujeitas a erros aleatórios, sistemáticos e grosseiros, alguns deles podem ser reduzidos e ou eliminados com certos procedimentos, (MONICO, 2008).
- Erros aleatórios são inevitáveis e é considerado inerente da observação;
- Erros sistemáticos podem ser modelados, reduzidos e ou eliminados por métodos de observações;
- Erros grosseiros podem ser reduzidos a partir da atenção e o cuidado do usuário.
A Tabela 1 detalha as fontes e os efeitos dos erros sistemáticos envolvidos nas observáveis, considerando as fontes (satélite, propagação do sinal, receptor/ antena e a própria estação).
Tabela 1- Fontes dos erros e seus efeitos nas observações GNSS
Fontes | Erros |
Satélite | Erro da órbita
Erro do relógio Efeitos da Relatividade Atraso entre as duas portadoras no hardware do satélite Centro da fase da antena do satélite Fase Wind-up |
Propagação do Sinal | Refração troposférica
Refração ionosférica Perdas de ciclos Multicaminho ou sinais refletidos Rotação da Terra |
Receptor/ Antena | Erro do relógio
Erro entre os canais Centro de fase da antena do receptor Atraso entre as duas portadoras no hardware do receptor Fase Wind-up |
Estação | Erros nas coordenadas
Multicaminho ou sinais refletidos Marés terrestres Movimento do pólo Carga oceânica Pressão atmosférica |
Fonte: Adaptado de Monico, 2008.
Vale ressaltar que marés terrestres, cargas oceânicas e a atmosfera não são exatamente erros e sim variações que devem ser consideradas para o posicionamento de alta precisão.
Para obter uma melhor precisão no posicionamento por técnicas GNSS é necessária a minimização ou eliminação dos diferentes tipos de erros citados. A partir dos anos 2000, um dos principais fatores que interviam no posicionamento com GNSS foi desativada. Este erro denominado de Selective Availability (SA) proporcionou uma melhora nos posicionamentos após sua desativação, porém outro erro de grande relevância ainda permaneceu, a ionosfera. Após a desativação da SA a ionosfera se tornou a principal fonte de erro nos posicionamentos por GNSS (MATSUOKA, 2007).
Descrição da precisão nominal S800 – Stonex
O receptor GNSS S800 é um equipamento robusto e possui as seguintes especificações: 555 canais, radio de 2w, suporta as constelações GPS, GLONASS, BEIDOU, GALILEO, QZSS, SBAS e IRNSS além de possibilitar ao usuário uma comunicação a partir de rede wi-fi com o receptor, essa comunicação permitirá acessar todas as configurações internas do receptor. Devido seu posicionamento ser corrigido em tempo real o receptor proporciona uma maior produtividade e a otimização do tempo em campo, gerando assim uma maior lucratividade, Figura 1.
A precisão de posicionamento se restringe de acordo com a metodologia adotada, detalhado na Tabela 2.
Tabela 2- Precisão posicionamento S800
Positioning | |
High Precision Static Surveying | |
Horizontal | 2.5 mm + 1 ppm RMS |
Vertical | 2.5 mm + 1 ppm RMS |
Code Differential Positioning | |
Horizontal | <0.5 m RMS |
Vertical | <1.0 m RMS |
SBAS Positioning | |
Horizontal | <0.6 m RMS² |
Vertical | <1.2 m RMS² |
Real Time Kinematic (<30 Km) | |
Fixed RTK Horizontal | 8 mm + 1 ppm RMS |
Fixed RTK Vertical | 15 mm + 1 ppm RMS |
Fonte: Adaptado, Manual Receptor S800 Stonex, 2018
Metodologia
O procedimento realizado em campo para a obtenção das coordenadas que serão tomadas como critério de comparação envolveram dois equipamentos distintos. A avaliação das coordenadas coletadas em campo irá adotar a Estação Total Ruide RTS 822R³ como referência de precisão.
Os equipamentos utilizados neste experimento são: a Estação Total e o receptor GNSS modelo S800 da Stonex. Toda a comparação será realizada entre esses dois equipamentos.
A priori foram rastreados dois pontos correspondentes a estação (E1) e a ré (E0) para orientação da estação total. Os pontos E1 e E0 são estáticos com 10 minutos de posicionamento e foram processados e ajustados empregando a base (POLI) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e o software GNSS Solutions. A tabela abaixo detalha as coordenadas e os erros das componentes horizontais e verticais.
Tabela 3 – Componente horizontal e vertical dos pontos de orientação da Estação Total.
E1 (Estação) | Este | Norte | Altitude |
Coordenadas (m) | 328822.833 | 7395012.478 | 762.885 |
Precisão (m) | 0.003 | 0.004 | 0.009 |
E0 (Ré) | Este | Norte | Altitude |
Coordenadas (m) | 328828.200 | 7395034.673 | 761.956 |
Precisão (m) | 0.004 | 0.006 | 0.007 |
Fonte: Adaptado relatório de processamento GNSS Solutions
Segue abaixo o momento da orientação da Estação Total a partir dos dois pontos rastreados com o método estático (E1 e E0), Figura 2.
Com a orientação do equipamento realizada podemos agora irradiar os pontos de interesse para determinação das coordenadas dos pontos P1 e P2 (Figura 3). A localização e a escolha dos pontos de interesse foram definidas levando em consideração as obstruções naturais, essa escolha é um dos parâmetros para a avalição dos erros cometidos com os receptores GNSS. É de extrema importância o teste realizado, principalmente coletando pontos em locais totalmente desfavoráveis, dessa forma pode-se analisar o desempenho dos receptores GNSS em condições diversas, condições essas estão presentes no dia a dia do profissional.
A coleta dos pontos P1 e P2 com o auxílio do receptor GNSS adotou a técnica RTK NTRIP utilizando a rede CEGAT e a base SPSP0. Lembra-se que esse método RTK NTRIP proporciona precisão horizontal de 0,010 m e na componente vertical de 0,025 m.
Resultados
Neste tópico serão detalhados os deltas (Δ) das coordenadas norte, este e altitude elipsoidal referente aos pontos de interesse, neste caso o P1 e P2.
Antes disso, segue abaixo a tabela das coordenadas utilizadas para a orientação da estação total (E1 e E2) (coordenadas pós processadas Tabela 3) e as coordenadas dos pontos adquiridos em baixo da vegetação (P1 e P2) como demonstrado na Figura 3, pontos esses serão utilizados para comparação, avaliação e validação do receptor GNSS S800 da Stonex.
Tabela 4: Coordenadas de orientação da estação total (E1/E2) e coordenadas dos pontos obstruídos por vegetação (P1/P2)
ESTAÇÃO TOTAL RUIDE R³ | |||
ID | Norte | Este | Altitude |
E1 | 7395012,478 | 328822,833 | 762,885 |
E0 | 7395034,673 | 328828,200 | 761,956 |
P1 | 7395063,888 | 328847,217 | 761,431 |
P2 | 7395026,987 | 328860,042 | 762,098 |
A próxima tabela detalha as coordenadas rastreadas com o auxílio do receptor S800. A apresentação da tabela facilita a compreensão dos dados coletados em campo.
Tabela 4: Coordenadas de orientação da estação total (E1a/E2a) e coordenadas dos pontos obstruídos por vegetação (P1a/P2a)
S800 – STONEX | ||||
ID | Norte | Este | Altitude | Solução |
E1a | 7395012,5000 | 328822,8170 | 762,9200 | Fixo |
E0a | 7395034,7220 | 328828,1880 | 761,9710 | Fixo |
P1a | 7395063,8363 | 328847,1588 | 761,5107 | Fixo |
P2a | 7395026,9959 | 328860,0787 | 762,0637 | Fixo |
Abaixo segue o gráfico da comparação entre a Estação Total Ruide R³ orientada com pontos provenientes do posicionamento estático e o receptor GNSS S800 da Stonex. De acordo com o Gráfico 1 nota-se que a maior diferença entre as coordenadas está na altitude para o ponto P1 com valor de 0,080 m e a menor variação se encontra na coordenada norte com 0,009 m para o ponto P2. De acordo com a Figura 3 o ponto P1 e P2 estão situados em locais desfavoráveis para sua determinação, mesmo assim os erros apresentaram abaixo de 0,080 m. Lembra-se que todos os quatro pontos apresentaram solução fixa.
Conclusão
Pode-se concluir a partir dos gráficos que o receptores GNSS Stonex S800 apresentam resultados satisfatórios mesmo em condições totalmente desfavoráveis para a coleta das coordenadas de interesse em comparação com as coordenadas obtidas com a Estação Total Ruide R³, onde a maior divergência foi de 0,080 m na altitude e 0,009 na componente norte.
Bibliografia
CALDAS, F. L. Análise de deformação da rede geodésica GNSS/SP com base na teoria da elasticidade. 94p. Presidente Prudente: [s.n], 2014.
MATSUOKA, M. T. Influência de diferentes condições da ionosfera no posicionamento por ponto com GPS: avaliação na região brasileira. 2007. 263p. Tese (Doutorado em Ciências Cartográficas) – Programa de Pós-Graduação em Ciências Cartográficas, Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente. 2007.
MONICO, J. F. G. Posicionamento pelo GNSS: Descrição, fundamentos e aplicações. 2º ed. São Paulo: Editora Unesp, 2008. 472p.
VEIGA, L. A. K.; ZANETTI, M. A. Z.; FAGGION, P. L. Fundamentos de topografia. 2007.